Ninguém se senta ao lado do mulá ou de Vassilyevitch Krupin sem se sentir apertado.
-Tens de dar uma cereja ao teu primo para ele voltar a falar - disse o general.
-Com a graça de Alá, ele fala - respondeu Elahi.
-Sim, mas só com as mãos.
-As mãos é que fazem coisas, não é a voz, pelo menos eu acho que não é a voz, não posso ter a certeza, que certezas só Alá é que tem. Quando é preciso descascar uma banana, usamos as mãos e não o som, não serve para nada o som. Não é assim, general Krupin? Não me olhe assim, estou a ser sincero, desculpe. O meu querido primo, gosto dele como meu irmão, em tudo o que faz está a falar, pois todos os seus gestos são palavras. Achha, não há diferença entre a voz e o acto, como acontece tão frequentemente por aí, basta olhar para aquele ministro, como é que se chama? Não me lembro, adiante, que alá os castigue, dizem que fazem e depois não fazem, ou pior, cometem desgraças, umas atrás das outras. O meu primo, que é para mim um irmão, talvez mais do que um irmão, eu nunca tive um irmão homem, não posso saber, mas adiante, quando o meu primo descasca uma fruta, não a descasca simplesmente, como nós fazemos, quando usa a faca está a falar com as maçãs e as mangas e os marmelos, porque as suas mãos são frases, são discursos.
O general Ilia Vassilyevitch Krupin fez um gesto de enfado e disse:
-Em todo o caso, devia comer uma cereja.
-Com licença, general, o meu primo, todos os anos visita a cerejeira de Tal Azizi, que árvore bonita, que milagre. Deita-se debaixo dela, mas diz que aquela árvore é como toda a religião: só nos impede de ver o céu.»
Para onde vão os guarda-chuvas
Afonso Cruz
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