«Ela deixa-o lavar-lhe o cabelo. Uma e outra vez, Marie-Laure acumula espuma nas mãos, como que a tentar calcular-lhe o peso. Sempre existiu nele um resquício de pânico, bem no fundo de si, em relação à filha: o medo de não ser bom pai, de estar a fazer tudo mal. De nunca ter compreendido verdadeiramente as regras. Todas aquelas mães parisienses empurrando os carrinhos de bebé através do Jardim des Plantes ou apreciando casaquinhos de malha nas lojas de vestuário - parecia-lhe que aquelas mulheres trocavam acenos de cabeça quando se cruzavam, como se cada uma delas fosse detentora de um qualquer conhecimento secreto que ele não possuía. Como saber com toda a certeza que se está a fazer a coisa acertada?
No entanto também existe uma sensação de orgulho - orgulho por ter feito tudo sozinho. Por a filha ser tão curiosa, tão resiliente. A humildade de ser pai de alguém de tamanho portento, como se ele não fosse mais do que um estreito canal para uma outra coisa maior. É isso que sente agora, pensa, ajoelhado ao lado dela, enxaguando-lhe o cabelo: como se o amor pela filha lhe ultrapassasse os limites do corpo. A muralha podia ruir, até mesmo toda a cidade, mas a luminosidade daquele sentimento não desvaneceria.»
Toda a luz que não podemos ver
Anthony Doerr
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