segunda-feira, 28 de abril de 2014

Página-a-página #118


«Ás vezes perguntava-se o que é que o seu eu de vinte e dois anos pensaria de Emma Mayhew de hoje. Considerá-la-ia egocêntrica? Conformista? Uma burguesa vendida, com esta gana de possuir uma casa e de viagens ao estrangeiro e roupas de Paris e cortes de cabelo caros? Achá-la-ia convencional, com o seu novo sobrenome e esperança de ter uma família? (...)
Não, isto, Emma sentia-o era a vida real e se não era tão curiosa ou apaixonada como fora outrora, era apenas por  ser inevitável. Aos trinta e oito anos seria desapropriado, indigno, conduzir amizades ou amores com o ardor e a intensidade de alguém de vinte e dois. Apaixonar-se assim? Escrever poesia, chorar com canções pop? Arrastar pessoas para dentro de cabines de fotografia, passar um dia inteiro a fazer uma cassete de compilação, perguntar às pessoas se queriam ficar na nossa cama, só para fazer companhia? Se citasse Bob Dylan ou T.S.Eliot, ou, Deus nos livre, Brecht a alguém nos dias de hoje, sorrir-lhe-iam educadamente e afastar-se-iam em silêncio, e quem os poderia censurar? Ridículo, aos trinta e oito, esperar que uma canção ou um livro ou um filme nos mudasse a vida. Não, tudo se nivelara e assentara e a vida era vivida sobre um pano de fundo geral de conforto, satisfação e familiaridade. Não haveria mais daqueles altos e baixos de arrasar os nervos. Os amigos que tinha agora seriam os amigos que teriam dentro de cinco, dez, vinte anos. Não esperavam tornar-se dramaticamente ricos nem pobres; esperavam manter-se com saúde ainda durante muito tempo. Estavam a meio; na classe média, na meia idade; eram felizes no sentido em que ainda não tinham deixado de o ser.»
Um dia
David Nicholls

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