quinta-feira, 30 de abril de 2015

Página-a-página #194


«(...) O nascer do Sol na Mongólia é qualquer coisa de extraordinário. Num abrir e fechar de olhos, o horizonte transforma-se numa débil linha que emerge das trevas e se estende devagar, como se a mão de um gigante lá no alto estivesse, lentamente, a fazer subir o manto da noite à superfície da Terra. Era uma visão sublime, de uma grandiosidade, como já disse entes, que ultrapassava em muito os limites da  minha consciência enquanto ser humano. Ao contemplar aquele espectáculo, tinha a sensação de que a minha própria vida se dissolvia pouco a pouco, até desaparecer no nada. Coisas banais, como as vicissitudes dos seres humanos, não tinham cabimento naquela dimensão. Desde tempos imemoriais, quando ainda não existia nenhuma forma de vida, o mesmo fenómeno repetira-se milhões, centenas de milhões de vezes. Atónito, fiquei ali, absorvido na contemplação do alvorecer, esquecido do dever militar.»
Crónica do Pássaro de Corda
Haruki Murakami

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