domingo, 2 de março de 2014

Março #4

Ela olha-se ao espelho e acha-se bonita. Nem as rugas na cara a fazem imaginar outro sorriso. A tez é a única possível. Colorida por anseios e desassossegos, força e equilíbrio. Nas concentrações descritas em livros de alfarrabista serem de mulher, desta mulher.

No olhar de pálpebras já semi-caídas pelos números da vida transparece um olho de amêndoa doce de sonho. Ajeita o cabelo louro com a certeza de quem fez tudo bem. Ela sabe-o. Vê no espelho a mulher que quis ser em criança. Era exactamente aquela, com as mesmas rugas e com o mesmo olhar. Era o esboço realizado. O sonho concretizado. A mulher.

Fuma um cigarro como sempre fumou, em cada trago entranha o sabor do momento e nele desperta o futuro certo que há-de ser. Vive para si e vive-se no mundo. É para ela que faz o mundo girar e para ela que faz a vida acontecer. A voz por vezes já falha palavras agora despidas de qualquer incerteza, o coração nunca lhe falhou. E assim será até ao último dos dias. O dia em que o coração lhe falhará. O único dos dias em que ele não a respeitará.


Hoje, ela olha-se ao espelho e sabe-se bonita.
Alexandra Oliveira Villar

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