domingo, 6 de outubro de 2013

Página-a-página #64


«Eis o que pensei:para o acontecimento mais banal se tornar uma aventura, é preciso, e é bastante, que nos punhamos a contá-lo. É o que engana as pessoas: um homem é sempre um narrador de histórias: vive cercado das suas histórias e das de outrem  vê tudo quanto lhe sucede através delas; e procura viver a sua vida como se estivesse a contá-la.
Mas é preciso escolher: viver ou contá-la.
(...) Quando se vive, não sucede nada. Os cenários mudam, as pessoas entram e saem  é tudo. Nunca há princípios. Os dias sucedem aos dias, sem tom nem som; é um alinhamento interminável e monótono.
(...) Viver é isto. Mas quando se conta a nossa vida, tudo muda; somente, é uma mudança que ninguém nota: a prova é que se fala de histórias verdadeiras. Como se pudesse haver histórias verdadeiras! Os acontecimentos produzem-se num sentido e contamo-los no sentido inverso. (...)»
Sábado, meio-dia
A náusea
Jean-Paul Sartre

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